sábado, 14 de abril de 2012

Cotidiano

    Por favor, mais força para que eu não deixe escorrer de mim os sonhos. E cuidado para que eu não me perca no caminho, porque eu insisto em viver. As minhas costas doem, meu estomago lateja, meus olhos ardem, meu coração pega fogo, eu quase não funciono. Vinte e quatro horas vivendo no esconderijo com medo do deserto lá fora e é por isso que me grito não sai. Quem chamará de triste? Todos estão totalmente atingidos e imensamente ocupados com o tempo compacto no bolso, afinal, ainda existem poucos destinhos a seguir, ou pior, um único.

    Eu tento sair e deixar uma janela aberta de propósito, deixando entrar o azul do céu consumindo as paredes quase rosadas do quarto, embora eu nunca experimentei o sabor de um dia diferente. Acrescento e  diminuo distrações no anseio de chegar e ver o calendário esculpido e perfeitamente encaixável na minha saudade de domingo, mas ele me convenceu primeiro. E em cada nova tentativa de fuga, os horizontes pareciam próximos e secos, baleados a queima roupa pela história de que esse novo mundo não é velho e o sol de amanhã é mais forte.

    Os pivetes correm pela rua mas não tão livres como querem. A física moderna rouba a curiosidade do dia de amanhã, o noticiário é triste, e a preocupação como celular no silencioso consome a juventude na fila do bar. Sei lá desde de quantos anos tudo passou a ser considerado normal.

    Já perdi a vontade de mudar o universo. As pessoas, seus títulos, os cartazes e suas verdades já foram trancadas e hoje são pacientemente suicidas. Nunca apenas pelos seus medos. Eu mastigo as palavras, a terra não deixa de girar, o relógio não para, os caros buzinam, o sinal vermelho mata a pressa. Medo é só o medo, o que eles têm e o que eu tenho vai além do propósito vazio de sair de casa, é muito mais que nossos olhos vedados, é a apenas um passo seguinte invisível. E isso soa tão assustador como quem o imaginou.

    O que eu preciso achar é a porta de partida e não a saída como todos pensam. Mas começar me apavora.

    Talvez a vida se resuma a isso. Conformismo. Ainda que existam muitos mistérios, o que está para se descobri é previsível como meu Fim. A lua que está no céu é a mesma para todas e a noite chega como um alívio necessário, porém, seriamente cronometrada. O dia é quente, as tarefas fazem a testa suar. Doença, guerra, tosse. Um menino pede esmola, um velho e seu cachorro pedem a Deus para que salvem da pobreza dos pedestres que correm e não alcançam o seu  futuro, porque não o aceita como é.

    O futuro é agora. Mas ele não deixa pistas disso.
 
     No meio da selva, escrever é meu suspiro de cansaço e o remédio que me machuca. A fuga que me leva a pensar que o mundo pode ser do jeito que eu quero, mas essa história de querer uma vida boa e viver bem sem participar da cadeia alimentar e a briga pelo poder quase me sufoca. Infelizmente, eu estou sendo engolida por tudo que critiquei um dia, e aceito isso. Mas eu não estou resmungando, não posso, ninguém pode. Eu e voce perdemos tudo ao nascer.

 E o silêncio ainda é o meu maior grito de protesto. 

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