quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

Júpiter apareceu no céu, e eu só conseguia pensar que toda a vida não passa de um desvio de órbita. Ou eu, quem sabe. A noite me abandonou com tanta angústia e dom de saudade - que bem pareço saber usar - a ponto de me pesar pelos dias flácidos e esquecidos no beco vazio da memória. Agora eu só sei padecer por reconhecimento no espelho. Só e impermeável. A última pétala da última rosa do deserto. Só que não sei ser flor. Só sei ser essa mulher intolerante na varanda com suas convicções intragáveis.

Enquanto isso, Igor chega e se acomoda na poltrona ao lado e começa a ler em voz alta alguma coisa sobre lúcido inconsciente. Eu queria que ele estivesse mesmo ali, sentado como se não se importasse com a diferença absurda que faz o céu hoje. Porque ele sabe não se parecer real, fica ali sem fazer questão da voz, da agradabilidade, da minha atenção. Igor não quer nada de mim. Talvez, que eu também só fique ali ouvindo ele recitar suas palavras absortas pela própria genialidade e entendimento. E sem cobranças as horas vão se estendendo e escoando a cada pausa que ele faz para buscar fôlego. 

"Com suas avenidas largas, com suas ruas cheias de esquinas e muros descascados: a vida é apenas a vida. Encolhida nessa multidão. Assim como o tempo só passa, sem despejar a cura ou esquecimento. E é por isso que os sábados vão ter sempre, no fundo, esse gosto da amargura, não importa o que eu faça. E nem quantos corações estarão em prantos, e nem quantas mandíbulas sorrirão, e nem quantos olhos dirão que doeu. Essa gente vai ter sempre pavor de viver sozinha."


É claro que eu não sabia nada sobre solidão até ele ler isso. Talvez soubesse, se fizesse questão. Agora, o sentido é outro, porque eu também tenho pavor de viver sozinha. Como uma lua. Eu só queria ser uma pessoa normal, daquelas que acordam de manhã  sem se preocupar como a natureza de manteve sonâmbula. Mas é justamente nesses momentos que Igor me olha depois de ler, que eu pareço uma criança assustada. Nada a ver com aquilo de voltar ao fundamento, que eu tenho compreensão de nada. Antes, uma desencantada com a imagem no espelho, porque tem a alma fora do corpo. Desviando do curso natural para encaixar no vácuo da vitalidade. 

"A maior dúvida ainda é viver. E viver com bravura, eu sei. Mas ás vezes, não é preciso ter coragem, basta o impulso. Feito a vontade, que de tão eficiente é uma arma que já atira sangue."

E o que ficava era a áurea de tudo que ele dizia. E parecia ser de propósito, como se me sacudisse dizendo que eu devia ser outra pessoa. Sem as inquietações, sem a transposição, sem o motivo do meu choro que vai morrer em segredo. Eu também pensava em ser outra pessoa depois de Igor. Mas

eu, sou inocente de mim. Desculpa. 

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