sábado, 10 de março de 2012

A história que inventei do casal no aeroporto

Esperavam-se em segredo duas bocas caladas que se reconheceram ao longe sem coragem de dizer que sentiram saudade, separadas por uma mulher de vestido vermelho que apertava a cintura enquanto eles apertavam a felicidade, diruindo-a a zero. A chuva lá fora era forte, daquelas que nos assustam de medo e admiração. 

Manuel e Antônia sentados de frente um para o outro habitando um dentro do outro, envenenados de esperança e doentes de tanto medo, planejando um futuro que teriam e liberdade que tanto pestearam. Mas era inútil, como tentar evitar que as folhas caem no outono, sonhar grandes sonhos em um horizonte finito e limitado pelas assombrações que amarravam seus braços a aquelas poltronas e deixavam o coração intacto e ameaçado. É medonho como tanto amor passa desapercebido enquanto eles fecham os olhos de pesar e lamentam o quanto isso poderia ser diferente. 

—  Voce já chorou, Antônia?
— Lógico.

Manuel não conseguiu olhar firme em seus olhos pretos e grandes para saber se foi honesta sua resposta. Nunca conseguiu encarar os olhos que contavam os segundos para o início do mundo, olhos que sempre trazem dificuldade em interpretar a dor e a felicidade dos caminhos que ela seguiu, caminhos cortados por indas e vindas e trocentos quarteirões de distância e histórias que ninguém saberá, mas ela jamais deixará esquecer. Tudo por conta do seu vício em esticar o relógio, cinquenta horas por minuto pra ver se existem possibilidades de escapar por um outro ciclo que não seja nascer, viver e morrer toda semana, mas que ele poderia experimentar se quisesse. 

— Verdade? Voce não tem cara de quem chora.
— É porque eu não tenho cara.
— Não?
— Eu só tenho coração e ele alaga os corredores e me afoga toda noite.

Antônia não se sentia a mesma pessoa, Manuel também não, mas ainda se assustava com a verdade. A verdade que o problema deles sempre foi ao contrário. Não faltou amor, não faltou fé, não faltou vida, não faltou nada. E isso incomodou as vezes. Duas pessoas com tanto a oferecer foram egoístas e pegaram suas dores só pra eles, cada um com sua tristeza e ilusão. Tudo isso porque inventaram que nada pode ser perfeito.

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