quarta-feira, 27 de junho de 2012

Natureza humana: um trauma


Entre o passado e o presente, entre o prosseguir do relógio para o futuro, um intervalo. Solitário como o espaço temporal entre um nanosegundo e outro, ligeiro e desapercebido. Nasce do fundo dos acontecimentos sem a intervenção do tempo, um pouco morto e eterno, um ponto, um buraco negro crescendo, cortando as horas, seguindo em linha reta e infinita: a essência do silêncio, a resposta mais sábia em qualquer trecho de vida.




   Não há medalhas de honra penduras na parede nem certificados de mérito em molduras douradas. Só a cortina lilás desbotada voando de um lado a outro, lá fora uma árvore me observando triste e seca. A janela aberta permite o escuro da noite entrar e cair empoeirado sobre os lençóis estendidos no canto isolado da cama. Isso poderia encobrir minha vergonha, respiro fadigada. Eu só tive coragem para me esconder, rosto estúpido e voz para responder que a culpa é a idade precoce. 

   Eu não tenho escrivaninha, normalmente solitários têm. Com cerca de três gavetas lotadas de papéis mas isso não significa nada, eu ainda tenho toda a essência da coisa. Mas a impossibilidade de pensar e sair dessa como todos eles no final, vem como um atormento viajado de longe entrando pela janela dançando com as cortinhas e despencando em mim. Ele me atravessa o tempo todo na vagidão silenciosa da madrugada, vazio como os minutos e em círculos - um círculo crescendo no espaço, como uma bola arremessada na minha consciência, deixando esse intervalo em perfeita harmonia com meu choro vibrando no quarto. 

   O teto branco se transforma em névoa, talvez me preparando para a fase seguinte da vida. Mas eu ignoro aonde eu deveria ir - ignoro? - demasiadamente sofrido desvendar o caminho, e seria necessário muitos intervalos consecutivos para misturá-lo à vida. Um longo e infinito intervalo que se movimenta para frente e para cima sem dar a impressão de agitação. Quando como se entra no elevador e não é mais possível definir seu tempo, seu trajeto, seu princípio e fim. Apenas um segundo quieto que me separasse do futuro seguinte. Baixo e largo.

   Olho impassível para o acontecer das coisas e tento me distrair em sua existência para tornar a minha invisível. Uma espécie de escapismo para temperar a realidade com sabor de sonho. É idealizar demais a fragilidade do meu ser? Essa é a primeira vez que percebo a ausência dos títulos exibidos e agonio em nome dos meus pais. Eu tanto aprendi nas galerias de arte e fui tão sábia no perceber das coisas e ninguém vem dizer que eu estou indo para o caminho certo. - E existe, pois, alguém para ditar qual caminho é o certo? - Eu ainda oro por um milagre que não me permita adequar ao padrão dos outros.

   Se ser alguém é o objetivo estabelecido lá fora, eu morro aqui. Sou erroneamente platéia assídua dos conselhos da noite, em que o silêncio tem vez e entende. As medalhas e os certificados não seriam  o bastante para afirmar que cheguei lá, seja lá o lugar que for. Seriam?

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