sexta-feira, 24 de agosto de 2012

 Posso fazer uma pergunta?

 Sim, uma.

 Já começou a escrever o livro?

 Ahã. Quer dizer, na verdade não. Eu tenho ele pronto na cabeça, mas na cabeça fica mais fácil. Falta título, personagem, estória. Para não dizer que só tenho a vontade, consegui uma frase para o Grand Finale. E uma dedicatória. Pelo menos uma linha. É muito difícil fazer uma dedicatória, Mari.

 Sei. E quantas pessoas têm nela?

 Só uma. Eu queria homenagear a Zalu, com uma frase bem bonita, do tipo "à sereia que chorou e fez mar". Também queria que tivesse a Mensageira com m maiúsculo, cerca de oito pessoas e as notas musicais de Bach. Eu até fiz uma bem grande falando de todas elas e também daqueles que não existem mas queria dar meu livro para eles. Mas eu disse que o livro ia ser uma resposta. Você sabe, Mari. Á mim mesma que sempre neguei e fugi dessa história de ser escritora, mas também a quem me pediu refutação. E bom, só uma pessoa me deu suas últimas palavras com um ponto de interrogação no final. Vai ser uma resposta a essa pergunta também. Eu acho que devo, você não acha?

 Não faz mal só ter um alguém para o dedicar, mas eu acho que você deve ter uma história primeiro, ou pelo menos, do que ela se trata. Porque eu já vi livros sem dedicatórias, mas nunca sem histórias. 

 É claro né, Mari. Mas é bem difícil pra mim contar alguma coisa sem me colocar no meio. Vai que eu resolvo escrever sobre uma Maria e no final essa Maria sou eu? E um José que era esposo da Maria fosse eu também? E no final, cada um que aparecesse fosse um pedaço de mim? Além do mais, eu me enjoo muito fácil de qualquer coisa. Imagina que trágico eu não conseguir contar alguém porque eu não mais a suporto? Você sabe que sou uma prisioneira de mim mesma e quero deixar-me de lado a todo instante, me descolar. Se eu começar eu tenho que terminar, eu cansei de intervalos, pausas. 

 Então eu acho que não compraria seu livro.

 Ah não?

 Eu o roubaria. Se seria sua vida contida nele, não há forma melhor de pagá-lo senão com a minha própria também.

*

É esse o momento em que a gente desconfia da vida e percebe por poucos instantes qual o seu verdadeiro objetivo. A televisão voltou a invadir a sala com suas cores e barulhos. Apesar de parecer um diálogo de festa, era a tristeza que reinava sob o teto escuro. E é ela (eu sei) a matéria prima do melhor livro do mundo.

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