terça-feira, 28 de maio de 2013

Cat Power ecoa e atravessa o ar. Tem três noites que eu não durmo e não vejo problema em arriscar a quarta. Eu já escutei muitas outras músicas perigosas nesse quarto escuro e sobrevivi. Sobrevivi, inclusive, as indagações dos meus olhos frente ao espelho. E contra isto não tem argumento, como não tem armas contra minha inquietação. E é nessa quarta noite de insônia que eu escrevo uma nota à lápis em rodapé, quase ilegível:

Eu sou uma impostora.

A noite quem diga: "uma impostora!". Enganando luas e estrelas e desordenando planetas em órbita com  mentiras que, em si, não importam. O que realmente importa são todas as vezes que eu escolhi de-li-be-ra-da-men-te acreditar em cada uma delas. E pior, não apenas acreditar, mas fazê-las o berço de todos os meus sonhos. A mão que eu escrevo com voz pedindo salvação. Mas ninguém ouve, ninguém lê, ninguém aplaude de pé. O fracasso, entretanto, não é o texto, mas a própria voz, aquela que eu arranco da garganta, deixando transbordar pela boca. Aquela que nasce pela escrita da minha mão. Ela não tem sinceridade. Pode ter alguma para os outros, mas não tem para mim. Não tem para minhas entranhas, para meu esforço, para o sangue que pulsa descontrolado dentro de mim. É um golpe. É tão impostora quanto eu. Diria até, mais ardilosa e trapaceira. É por isso que eu não durmo. Para tentar quebrar uma a uma. Despedaçá-las como eu rasgo os textos que escrevi com meu nome. Porque elas me olham com olhos furiosos dizendo "Vamos lá! Vamos ver até quando você aguenta!". E eu não sou tão forte nem tão esperta. Por não ser é que escrevo. Se eu fosse não precisaria. Mas a medida que escrevo passo a ser. E, agora, não com traição nos lábios ou nos dedos. Nesse instante que nasce, nesse momento que eu choro, nessa exclusividade do dia. Eu sinto subir uma verdade pelo punho que sai pela língua. A primeira. Que fazem as pálpebras trepidarem. Querendo adormecer e censurar aquilo que eu digo para ninguém ouvir. Aquilo que ordenam estrelas e alinham os astros no universo. É duro negar uma vida. Quem dirá uma vida inteira. Mas é vezes é essencial. Pelo impulso de ser só. A solidão e a vergonha tem me sobreposto a todas as minhas camadas. A todas as minhas mentiras. Doces e pesadas como são. 

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