quinta-feira, 14 de maio de 2015

A solarística

Foi um ensaio glorioso sobre o amor. Sobre a existência também, mas sobretudo sobre o amor. Moveu as concepções humanas diante do imenso vazio espacial. Oh Katherine, o objetivo do ser humano é descobrir a si mesmo, seja na forma de feto na placenta, seja na forma da mulher amada. Não importam os outros mundos, não precisamos deles, só queremos um espelho. Os astronautas não foram enviados para conhecer o misterioso oceano de Solaris, vê? O encontro com outro, Katherine, é um encontro com si. Não há solução para isso, não há possibilidade de defesa quando, de repente e sem querer, é nossa consciência projetada selvagemente que nos apavora.

Mas o que de fato deve ser percebido é a fragilidade da nossa própria dúvida, da nossa curiosidade, é aquilo que nos aproxima do abstrato, do inomeável, do real. Eu entendo, Katherine, que para preservar algumas verdades precisa-se do mistério. Os mistérios da felicidade, da morte e do amor. Dizem que os homens felizes são os que nunca se interessam pelos mistérios porque pensar sobre isso é o mesmo que saber o dia de morrer. Talvez não pensar os tornem, no fundo, imortais. Mas talvez, Katherine, só talvez, eu não queira ser feliz. Ou imortal. É uma questão banal, ninguém nunca sabe quando é o fim, então o mundo anda com pressa.

E não apenas isso, o desconhecido e não rara, nossa rasa lucidez é capaz de fazer notar o desequilíbrio que nos compõe, sempre em loucura e angústia. E em ilhas de fantasia, em sonos distantes e em incertezas cruas. Ou ainda em inquietações. Prefiro ver, Katherine, como benefícios. Como que, se fosse possível voltar no tempo, ver o amor sem ser mancha. Mas é como foi dito, Katherine, desde o início: foi um ensaio glorioso sobre o amor.

E o homem ama o que se pode perder. Até hoje a humanidade e a Terra estiveram fora do alcance do amor.





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