segunda-feira, 25 de junho de 2012

Você me fala de coragem enquanto eu sinto medo

- É... é como estar caindo. 
- Me explica melhor, amor. Ainda não estou entendendo.
- Ah, me desculpe as poucas palavras. É que hoje elas fugiram de mim.
- Elas estão sempre correndo de você, Alice. Basta alcançá-las.
- Isso lá é bom, Miguel?
- Tenta, amor. Só tenta. Desacostuma com a mania de escrever para ninguém ler.
- Eu só tô tentando te fazer ouvir além do som da minha voz, entende? Assim como eu sinto doer minha imagem no espelho, mas reflexo não dói. Mas é assim, como estar se desprendendo fatalmente da minha parte cheia de inocência. E lentamente ela vai ficando desfocada, desaparecendo até que no espelho só tenha traços sem forma, vazio, sem sentido. 
- Sim, sim. Mas você não para de olhar pra ele. 
- Isso, eu não deixo de encará-lo porque toda vez eu deparo com uma forma diferente, e ao mesmo tempo que isso me assusta, me acalma. As vezes eu queria ser outra e logo depois penso no que implicaria dar meus pensamentos e sentimentos para alguém.
- O medo é defesa, amor. É bom que você tenha medo assim como eu.
- Você tem medo?
- Eu o sinto como um intruso analisando minhas gavetas secretas, sabe? Como alguém que caminha pelo chão da minha casa a noite descobrindo as minhas fotografias, minhas cartas... eu tenho medo que me descubram, por isso cobri meu espelho. Você deveria tentar, Alice.
- Eu prefiro deixar, Miguel. Melhor ter medo desse intruso a mim. Eu tenho pavor do que minha cabeça é capaz. É perigoso, você sabe. 
- Eu sei, mas não queria saber, ou talvez fingir que não sei. É terrível saber o fim de alguém.
- Você sabe do meu fim, amor?
- Eu sei. 
- Como?
- Eu enxergo o seu rosto, Alice. Você tem olhos de quem anseia felicidade mas não confessa para não dar o braço a torcer, eu conheço bem sua ignorância em não ter os mesmo ideais que os outros. Mas a dor nos iguala, amor. Você abre a janela e pensa em pular pra sentir o vento no rosto e a liberdade, mas isso ainda não te deixa livre, quando cair não será tão feliz, porque você sabe que pode sentir o mesmo vento enquanto corre. Mas você tem preguiça de sair do lugar, você será infeliz para sempre, Alice. Não quer terminar caía no chão á alguns metros abaixo da janela, mas antes quisesse. Morrer encima dela é bem pior.
- Nunca alguém falou isso de mim, Miguel.
- É que todo mundo esperou que você tivesse coragem para descobrir sozinha...
- Uma vez eu até tentei.
- E como foi?
- Foi como... como estar caindo.

Um comentário:

  1. Eu oro para que você consiga apalpar seu estômago. Não sei como não vê beleza, verdades e mentiras nos seus textos e palavras. Não sei o por que de ter nojo ou medo ou simplesmente ficar estático por querer tudo. Queira uma coisa de cada vez e as faça. Eu sei menina, você consegue muito mais do que foi dito aqui.

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